Em humanos, de acordo com a
Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP) “a dor é caracterizada como uma
experiência sensorial e emocional desagradável associada a dano tecidual real
ou potencial, ou descrita em termos de tal dano”. Entretanto, a dor apesar de remeter sensação de aversão
não tem só aspectos negativos, pois ao pensar no viés evolutivo, a dor
relaciona-se a proteção e sobrevivência. A dor pode ainda ser influenciada por
diversos fatores subjetivos, como experiências anteriores, estado emocional,
personalidade, entre outros.
A dor pode ser percebida
inicialmente pela detecção de estímulos danosos, a partir de nociceptores, que
são receptores sensoriais, sendo estes terminações nervosas livres responsáveis pela detecção de
estímulos térmicos, químicos e mecânicos intensos. As informações detectadas
pelos nciceptores são conduzidas ao Sistema Nervoso Central (SNC) por meio das
vias espinotalâmicas, que dividem-se em dois tratos principais, o trato
neoespinotalâmico e o trato paleoespinotalâmico, que chegam ao tálamo e
projetam-se para o córtex somatossensorial através dos núcleos lateral e
medial, onde ocorre de fato a interpretação da informação nociceptiva. As vias
e os mecanismos que envolvem os sistemas nervosos são ativados por aferências
nociceptivas somáticas e viscerais (PURVES, 2010; BASBAUM, 2000).
As
fibras de condução para o SNC são do tipo Aσ e C; as fibras de tipo Aσ são
mielinizadas de condução rápida, já as do tipo C são polimodais, amielínicas e
de condução lenta. A dor pode ser ainda resultado da liberação de substâncias
químicas como “cininas”, histamina, serotonina, acetilcolina, prostaglandinas,
entre outras, relacionadas à resposta inflamatória em resposta ao dano tecidual.
A modulação inibitória da nocicepção é denominada analgesia e pode ser
realizada por mecanismos endógenos como como os opióides e canabinóides, que
são liberados naturalmente em situações de medo e estresse, a partir da estimulação
da Substância Cinzenta Periaquedutal (PAG) (PENHA, 2001; JULIUS, 2001).
A
espécie Megalobulimus oblongus
pertence ao Filo Mollusca e a classe Gastropoda, encontrado no sul do Brasil,
Paraguai e Argentina, sendo considerada terrestre, hermafrodita e com
reprodução facilitada. O M. oblongus
pertence ainda à subclasse Pulmonata, em que houve a transformação da cavidade
do manto em um pulmão. Essa espécie geralmente habita em locais úmidos,
protegidos e escuros e são de hábitos noturnos.
O SNC do M. oblongus é
simplificado, sendo composto por onze gânglios, dos quais nove fazem parte do
anel ganglionar principal (gânglios cerebrais, pleurais, parietais e visceral)
que circunda o esôfago. Esses gânglios encontram-se dispostos em pares, com
exceção do visceral (FRAGA, 2002).
Fonte:
Fraga (2002).
Em um estudo realizado por Penha
(2001), na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, foi separado três grupos
de caracóis utilizando um estímulo térmico aversivo. O primeiro grupo
(controle) manteve-se a temperatura ambiente; o segundo grupo foi mantido em
uma placa a 45°C, e o terceiro foi submetido a 50°C. Os resultados encontrados
foram semelhantes aos já descritos pela literatura, com a presença de
movimentos aversivos em que o animal busca fugir da superfície aquecida. Há
também a notável presença do reflexo de retirada observado no contato da rádula
com a superfície e liberação excessiva de muco. Houve também a administração de
morfina durante o experimento objetivando aumentar a latência em relação ao
grupo controle e o grupo tratado com solução salina. E apesar da latência ter
se alterado as respostas motoras referentes à estimulação se mantiveram, sendo
observado a retração corporal do animal (PENHA, 2001; FRANKLIN, ABBOTT, 1989).
O gráfico abaixo retrata a estimulação térmica realizada nos grupos do estudo e
sua respectiva latência.
Fonte: Penha (2001).
Se comparado o SNC M.
oblongus com de um ser humano há uma simplicidade entre os mecanismos e
processos envolvidos na percepção, interpretação e resposta aos estímulos
nocivos, entretanto pode-se observar comportamento capaz de identificar uma
resposta nociceptiva.
Escrito por Letícia Rodrigues Pinheiro
Referências
IASP (International Association for the Study of Pain). IASP Statement on Opioids. Disponível em: https://www.iasp-pain.org/Advocacy/Content.aspx?ItemNumber=7194. Acesso em: 12 out. 2019.
BASBAUM, A.I.; JESSELL, T. The Perception of Pain. In: KANDEL, E. R.; SCHWARTZ, J. H.
Principles of Neural Science. Elsevier: New York, 2000.
FRAGA, L. S. de. Efeito da anoxia sobre o metabolismo de
carboidratos no sistema nervoso central do caracol Megalobulimus oblongos
(Gastropoda: Pulmonata). 2002.
FRANKLIN, K. B. J; ABBOTT, F. V.,
Techniques for assessing the effects of drugs nociceptive responses, in
Boulton. Neuromethods Psycopharmacology,
Human Press: New Jersey, 1989.
JULIUS, D.; BASBAUM, A.I.
Molecular mechanisms of nociception. Nature, v. 413, n. 6852, p. 203,
2001.
PENHA, M. A. P. Um modelo de comportamento aversivo
térmico em Megalobulimus oblongus e a
ação de fármacos nos sistemas opióide e serotoninérgico envolvidos na
nocicepção. 2001.
PURVES, D. et al. Neurociências.
4. ed. Artmed Editora, 2010.